sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Adagas voadoras 3


“De início foi complicado seguir aquele larápio, ele entrava por vielas e frestas e parecia tentar despistar alguém, mesmo eu sabendo que ele não me via. Vi quando caminhou cuidadoso com suas bolsas pela borda do fosso de Vila Forte e desceu pela colina até uma pequena floresta. Eu o acompanhava de longe. Quando passei pela primeira árvore não o vi. Mata densa e algumas luzes que desciam tênues contra o silêncio do final de tarde. Nada do garoto por ali, caminhei para o leste seguindo uma trilha do que julguei ser o peso de sua bolsa sendo arrastado e notei que o terreno começava a se inclinar.
As folhas nessa época eram avermelhadas, isso dava uma cor diferente aquele final do dia. Me deparei com o precipício. “Porque diabos decidi seguir esse moleque¿ “ – Pensei, olhando para baixo, onde uma queda d’água batia violentamente contra a rocha. A noite caía e eu tinha apenas o som de pássaros e  o barulho da água.
Sentei sobre a grande pedra à beira do abismo, sem pistas. A luz de uma fogueira brilhava de quando em quando no meio daquele arvoredo ali embaixo e percebi que teria de escalar até lá para chegar até ela, devia ser o moleque, acampado. Desci e qual não foi a surpresa: No meio da mata, a volta de uma fogueira o menino comia e dividia sua comida entre mais 9, 10 outras crianças. Algumas delas seguravam pequenos arcos e outras pareciam concentradas no fogo. Uma das meninas parecia ter 13, 14 anos e olhava para os outros, sentada sobre um galho acima da fogueira e brincando com uma pequena faca. Todos vestiam trajes gastos e falavam pouco. Parecia um ritual, todos comiam em silêncio e concentrados. Liinhue, o menino, estava sentado ao lado de uma pequena caverna. Aproximei-me do círculo onde eles comiam agachado entre os arbustos e cipós presentes ali  na beira do riacho, e pude ver que algo se movia próximo a ele. Não pude acreditar, era mesmo verdade. Ali estavam os filhotes de dragão. Segurei o fôlego.  Um era azulado e tinha as patas traseiras mais fortes, unhas amarelo vivo, os outros dois esverdeados e com um rastro vermelho na testa, idênticos. Respirei por um instante, tentando não ser visto, para não atrair a atenção dos dragões ou das crianças. “Mas que grupo mais exótico é esse aqui...” – pensava.
Liinhue os alimentava com carne, e com algum liquido escuro. Os filhotes gêmeos tinham o tamanho de um lobo já, e suas brincadeiras eram violentas entre si. Liinhue permanecia calmo, como quem cuida de cães. O azulado era o menor deles, mais novo e tinha ainda o tamanho de um gato O menino o segurava no colo e ele comia frutas. Isso era fantástico, nunca pensara em algo desse tipo. Decidi sair dali, para que não me notassem -- mesmo sendo crianças, eu já tinha visto o show do pequeno, e não queria encrenca.
Foi quando pisei em um galho. Um estalo no escuro e uma pedra que rola. Escutei algo que não pude entender, e depois veio a pancada na cabeça.
Acordei amarrado com cipós no alto de uma árvore, sem ninguém por perto.”



Se ainda não leu, aqui está a segunda parte.





Carlos La Terza

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